sexta-feira, 4 de maio de 2012

Memórias Silvestres


Morangos Silvestres (1957), filme do sueco Ingmar Bergman, é mergulho inequívoco na memória, é viagem onírica ao passado, é a audácia de postar-se diante do espelho belo e perverso que resguarda tudo o que fomos, tudo o que escolhemos ser – desde aquelas quimeras da infância, do tempo que a vida parece ser infinita, até quando os anos chegam e a sobriedade da vida adulta nos obriga a enxergarmos tudo em preto e branco.

Morangos Silvestre é um road movie peculiar, cuja temática espelha talvez a maior das neuroses sistematicamente decalcadas na cinematografia de Bergman: a impotência do homem diante da finitude da vida, sua pequenez e necessária resignação confrontadas com essa situação, aquela nostalgia e aquela melancolia que se debruçam sobre todo ser que vê uma etapa tão cara a ele chegar ao desfecho (seja um encontro de uma hora, seja um relacionamento de cinco anos, seja uma vida centenária: todos esses desfechos engendram uma e várias mortes).


Morangos Silvestres é, sobretudo, uma delicada história de formação. Mas não respeita a ordenação natural das histórias de formação. Ao contrário de neófitos que passam a descobrir as verdadeiras cores do mundo a partir de experiências inesquecíveis, é o professor Isak Borg, idoso e comemorado médico sueco que prova as dores e as delícias de sua adolescência tardia. É, contudo, na interação com os passageiros que leva consigo – a nora em crise conjugal com seu filho, três jovens andarilhos a caminho da Itália e um casal com nervos à flor da pele –, que Borg finalmente reencontra sua memória, exorciza paixões frustradas, cicatriza problemas familiares do passado, enfim, reencontra a humanidade, a poesia e os morangos silvestres – selvagens, pouco pragmáticos, até românticos –, da infância e da adolescência. 

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