quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A caminho dos bairros

O Nossa Comunidade tem História trabalha em dois núcleos: as Rodas de História, encontros com moradores dos bairros Ermo, COHAB/Santa Rita, Bom Fim e São Jorge/Primavera; e a Oficina de Vídeo e Fotografia, capacitação de jovens guaibenses em ferramentas audiovisuais. O grande objetivo é estabelecer o diálogo profundo entre as histórias contadas nas Rodas pelos moradores e o aprendizado recolhido em sala de aula pelos alunos.

Para alcançar tal objetivo, a interação dos núcleos é fundamental. Ela foi ensaiada na visitação a museus em Porto Alegre, no primeiro semestre, e em encontro no PROJARI, no mês de setembro. Mas agora se intensifica. O motivo é a preparação de uma exposição para o mês de dezembro. Uma espécie de amostragem do que foi desenvolvido até agora no projeto. Moradores da Santa Rita e São Jorge já receberam alunos da oficina e transformaram-se em guias pelas ruas locais. Até a metade de novembro, será a vez do Bom Fim e do Ermo.

Nas próximas semanas, novidades sobre a data da exposição e alguns dos registros fotográficos das caminhadas nos bairros.

sábado, 1 de outubro de 2011

Imaginário reconciliado




Há uma ditadura instaurada sobre a cultura brasileira. Uma ditadura de lendas, mitos e histórias oriundas da América do Norte, uma imigração perversa que varre com pressa e sem precedentes o folclore, a cultura popular, a tradição oral do Brasil e da América Latina para sob um tapete de ignorância e dependência. Nessa área conflagrada, não há alternativa outra que reforçar o imaginário dos mitos daqui para as gerações mais novas, revelar que o palco do teatro brasileiro pode ser interessante e deveria ser prioridade em relação às séries enlatadas do hemisfério norte, revelar que o Negrinho do Pastoreio resguarda uma história tão intensa quanto os vampiros e lobisomens anglo-saxões. E como é bom saber que há em Guaíba quem levante essa bandeira com propriedade.

Falo de Denise Beineke, falo de Patrick Braga, falo do show Imaginário Contado, inventário musical de nossas lendas e mitos folclóricos apresentado sábado, dia 24, no Museu Carlos Nobre. Armado da voz de Denise, textura talhada para canções que versam sobre o imaginário bucólico e misterioso das lendas, mistura de ternura e selvageria, e do violão, da gaita de boca, mas, sobretudo, do acordeom dedilhado por Patrick, do acordeom dedilhado com o cuidado de quem manuseia um frágil coração – não à toa o instrumento junto ao peito –, o Imaginário Contado expele pelas cordas do violão, pelas teclas do acordeom, pelas vozes de Denise e Patrick, a mais genuína e radical cultura brasileira.

A origem do projeto é sugerida no convite, com epigrafe de Mario Corso, e foi reforçada no espetáculo por Denise, inclusive com a presença e contribuição do psicanalista e escritor. No livro Monstruário, Corso investiga as lendas e os mitos da cultura brasileira, perscruta nosso imaginário e reconcilia a cultura oral com a palavra escrita. Denise e Patrick apropriaram-se dessa iniciativa e somaram a ela o ritmo enviesado de nossa música. E nessa peculiar ciranda de três compassos, baila Tom Jobim e seu Boto, bailam Dorival Caimy e Manuel Bandeira e sua Balada do Rei das Sereias, bailam Sá e Guarabira com suas e nossas Sete Marias . Nessa ciranda de três compassos bailamos todos nós.

E se há uma ditadura instaurada sobre a cultura brasileira, se há amarras por sobre o verbo de nossa tradição oral, também há vontade de gritar Bate com o pé na pedra / Bate na pedra preta / Quem bate com pé firme e forte / Não tem medo de careta, há vontade de gritar Acenda velas quem não sabe o resto / Da velha história que eu / Cortei ao meio / E ao pé da vela deixe fumo em rama / Para o negrinho do pastoreio.* E para a nossa sorte, aqui mesmo na aldeia, há quem assuma a guerrilha, há quem se arvore do violão de do acordeom. Há Patrick e há Denise. Há ternura e selvageria. Há poesia e canção.


*Os trechos transcritos no último parágrafo pretencem às canções "Tio Barnabé", de Jards Macalé, Marlui Miranda e Xico Chaves, e "Era uma vez", de Aparício Silva Rillo e Mário Barbará.


Uma vez por mês, a Memória encontra eco na Arte aqui no Blog. Uma vez por mês, o projeto Nossa Comunidade tem História dialoga com alguma manifestação artística que tenha na Memória um de seus temas centrais.